O futebol é uma paixão do povo brasileiro. É vezeiro encontrar os bares e as reuniões de amigos ao redor de uma mesa, em frente a uma televisão, assistindo a uma partida de futebol.
O Grupo Skank declama em música a poesia do futebol:
Posso morrer pelo meu time
Se ele perder, que dor, imenso crime
Posso chorar se ele não ganhar
Mas se ele ganha não adianta
.
O meio-campo é lugar dos craques
Que vão levando o time todo pro ataque
O centroavante, o mais importante
Que emocionante, é uma partida de futebol
Jailton é um amigo que torce pelo Confiança, um time aqui de Sergipe que foi elevado à série “b” do futebol brasileiro no ano de 2019. Jailton é um aficionado pelo seu time do coração e capaz de atitudes que fogem do raciocínio normal.

Dentre os torcedores do Confiança que formavam roda com Jailton, havia um senhor de nome
Gilberto. Gilberto era casado e sua mulher vivia lá pelas bandas de Ilhéus, na Bahia.
Gilberto largou-se da mulher e dos filhos e veio viver em Sergipe, com uma mulher bem mais nova, lá no Município de São Cristovão.
Gilberto teve um piripaque e morreu, deixando as duas viúvas. A mulher Maria, lá de Ilhéus, a qual ele ainda estava casado e, vez por outra, fazia uma visita de saudade e a novinha, também Maria, de São Cristovão.
Não sei quem informou à Maria de São Cristóvão que, para se tornar uma viúva pensionada pelo previdência social do INSS, ela teria que enterrar o defunto.

O fato é que ela não abria mão do enterro.
No calor e nas emoções do velório, esta notícia espalhou-se , de forma que a Maria de Ilhéus, junto com os filhos do casal, também fazia questão de descer a pá de terra derradeira no extinto Gilberto.
Aí entra Jailton. Os amigos torcedores do confiança, já conhecidos de Maria de Ilhéus, tomaram as dores da família e Jailton – e mais dois amigos (Zé e Silva) –
resolveram ir para o velório e respectivo enterro que ocorreria em São Cristovão.
Assim, ao redor de uma mesa de bar, onde estavam bebendo o dia todo, resolveram, de inopino, viajar para o enterro.

Jailton disse: – Vamos todos os três no meu carro.
O carro de Jailton era um Corsa hatch prateado que possibilitava rebater o banco traseiro e fazer uma grande mala.
Arrumaram um isopor. Colocaram algumas cervejas e se dirigiram para o enterro.
No caminho para o enterro, quando estavam quase chegando, observaram que a comitiva fúnebre estava retornando e foi aí que descobriram que o morto seria enterrado em um cemitério clandestino que havia na localidade e tinha sido providenciado por Maria de São Cristovão.
Seguiram a comitiva e lá chegando resolveram que Gilberto e sua família de Ilhéus mereciam um enterro mais digno.
Criou-se o impasse. Maria de São Cristovão não abria mão de enterrar Gilberto e os amigos queriam ajudar Maria de Ilhéus que também queria propiciar as honras finais fúnebres de Gilberto.
Nesse meio tempo, o coveiro clandestino começou a pressionar porque já havia abaixado o cadáver do rabequinho quatro vezes. E sobe defunto e baixa defunto, o coveiro bradou: – Vocês resolvam a questão, pois eu preciso me desocupar antes que o finado comece a feder.

A única solução que Jailton, Zé e Silva encontraram foi roubar o defunto.
Confabularam. Abaixaram o banco traseiro do Corsa, deixando-o rebatido. Abriram a mala e prepararam o furto.
Não teve plano, nem estratégia. Chegaram na mão grande, pegaram o caixão com Gilberto dentro e jogaram no fundo do Corsa, saindo em alta velocidade.
Houve uma ligeira perseguição, mas Maria não tinha carro e ficou pelo caminho.
Lá na frente, observando que a barra estava limpa, pararam o veículo, já na rodovia João Bebe Água, que dá acesso a Aracaju e foram decidir o que fazer.
Desceram o caixão, colocaram no acostamento e ali ficaram com o Gilberto, bebendo as cervejas e esperando Maria de Ilhéus e os filhos para prosseguir a inumação.
Veio a dúvida. E a guia de sepultamento. Sem ela não haveria enterro.
Então, deixaram Gilberto esperando lá no acostamento, devidamente acomodado dentro do caixão e foram até Maria de São Cristovão pedir a guia de sepultamento.
Aí os ânimos já estavam serenados e o assunto foi ligeiramente resolvido mediante o pagamento da quantia de R$ 500,00.
Voltaram para a Rodovia, pegaram Gilberto e colocaram no carro fúnebre que a família havia contratado e o levaram para Ilhéus onde foi dignamente enterrado.
No outro dia, já na ressaca, e sabedor de que poderia haver consequências, Jailton procurou meu irmão Emídio, contou a história e buscou aconselhamento.

– Emídio, eu vou ser preso?
Ao que Emídio respondeu:
– Não Jailton. No Brasil quem rouba dinheiro não é preso, avalie quem furta o cadáver de um pobre coitado que de nada vale. Não haverá nem processo.

Assim foi.