Minha mãe Susete sempre me disse, “Nada abala sua trajetória se você sabe para onde quer ir”.
E assim, no ano de 1994 participei de novo do festival, agora voltando para minha origem como compositor e não
mais como coordenador. Escrevi “Bacamartada”, música da minha pesquisa com a cultura popular que fazia desde o final dos anos 80, e mais diretamente com o grupo Bacamarteiros de Aguada. Levei o grupo para apresentação no Augustus e foi lindo, todos comentavam que as melhores músicas do festival eram “Bacamartada”, e “Salada Tupiniquim” de Ismar Barreto. As classificadas foram “Salada Tupiniquim” de Ismar Barreto e “Quero ser deputado” da Banda UTI 06.
Soube que uma das juradas me deu zero, alegava plágio dos bacamarteiros, que estavam comigo no palco. Logo depois, ela mesmo me encontrou e disse que tinha dado zero. Só tive o trabalho de explicar o que é um plágio e o que não é. Uns diziam que a moça era mal informada, já outros mal-intencionada. Entendo todos os resultados e que a minha participação em festivais foi sempre uma grande diversão, alegria e aprendizado, mais de 40 (quarenta) em toda a minha carreira.
Em 1994, o resultado não poderia ser melhor, ganhamos o Canta Nordeste com Ismar Barreto e sua Salada Tupiniquim era a nossa quinta vitória.
Em 1995, participei de novo como compositor do certame e escrevi a música “Batom da Alma”, uma parceria com Alexi Pinheiro. Dessa vez convidei uma musa do canto, Gena Ribeiro, aracajuana e filha de Eugenia Ribeiro, sobrinha de Marcelo Ribeiro e consequentemente, minha prima. Uma intérprete comparada as melhores do mundo para a minha canção, e é aí que a história fica muito curiosa.
Gena estava se formando em arquitetura na UFBA em Salvador e não podia participar dos ensaios então, fui direto a coordenação do festival que tinha Markus Troleis e Renato Machado a frente, e solicitei que me liberasse para ensaiar e montaria os arranjos com a banda base, e que a Gena faria a interpretação no dia do festival. Ainda solicitei se possível ela fazer uma passagem do som no mesmo dia. Gena só conseguiria chegar exatamente no dia do festival, pois no dia anterior estaria entregando o seu trabalho de conclusão de curso.
Recebi da coordenação a aprovação das solicitações e um comentário que iria liberar, pois só a Gena e a música poderiam serem prejudicadas já que ela não tinha ensaiado dia nenhum. Eu mandava nos dias de ensaio uma fita cassete pelo ônibus Aracaju/Salvador e ela acompanhava tudo ouvindo os ensaios.
O Festival foi realizado no Gonzagão, espaço que a Secretaria de Cultura alinhou com a TV Sergipe para realizar todos os eventos do ano da TV, pois era um plano de divulgação e valorização do complexo.
A coordenação classificou duas músicas de artistas baianos e ninguém questionou, como sempre fui em defesa do que acredito, liguei para a emissora e solicitei que revisse isso, pois a Bahia fazia sua eliminatória e que não seria justo um artista de outro estado e que não residisse nele fosse o representante na final. Não adiantou muito e ainda recebi uma piada do diretor dizendo, “Quem não tem capacidade não se estabelece”.
Entre os classificados estavam Ismar Barreto, Kleber Melo, João Alberto e João Melo, Joésia Ramos, Mingo Santana, Sena e Sergival, Lina Sousa, Iracema entre outros notáveis da nossa música, um total de 18 concorrentes.
Fomos ao festival e Gena arrebentou, ganhou tudo, melhor música, melhor arranjo e melhor intérprete e era a representante de Sergipe, e o segundo lugar foi um dos baianos com uma canção linda “Vertente dos Versos” de Carlos Vilela.
E não é que os outros artistas se revoltaram? Eu comigo pensei, “Eu avisei!”.
Mas para minha surpresa, a revolta era comigo e com Gena, e não com a música de Carlos Vilela. Não estavam preocupados com um baiano representando Sergipe. Eles não conseguiram segurar o ego inflado de todo artista e partiram para agressão contra uma menina em começo de carreira, mas com um potencial que poucas cantoras no Brasil tinha. Diziam:
– Ela é mineira, nem mora em Sergipe, até canta bem, mas não se compara a fulana…
Comigo a situação ficou mais séria, pois atacaram com toda força o meu caráter e a minha postura profissional, tentando aniquilar a minha imagem e assim a minha vida. Uma pessoa pública trabalha com a construção da sua história. Me acusaram de ser o coordenador do festival, de ser o dono da banda base, de convidar os jurados, pois todos eram meus amigos, de manipular na hora da votação as notas, de ter privilégios nos ensaios e outras coisas criativas bem a feitio de artistas, por que vocês não se enganem, o artista tanto é criativo para o bem como para o mal, ainda mais com seu ego ferido. O interessante é que em momento algum comentavam se a música era boa ou não. E o mais importante é dizer que, isso tudo que eles me acusavam de fazer era para concorrer ao prêmio de um violão Del Vecchio patrocinado pela Casa do Artista, do meu amigo de infância Mingo Santana, e que era um dos concorrentes no festival.
Com toda essa energia negativa e a TV Sergipe processada por esses artistas (me lembravam dá frase de Hilton Lopes, “Passarinho que briga com o pé de pau, não tem onde dormir”.), fomos para a semi-final no Maranhão e para a final no Rio Grande do Norte. A canção ficou em quinto lugar, à frente da música da Bahia e reencontrei meu amigo Raposo.
Muitos dos artistas que participaram desse momento, vieram com o tempo me procurar e pedir desculpas, pois foram levados a pensar e agir erroneamente. Com toda honestidade, nunca me importei pelo que eles pensavam ou achavam e além do mais, o tempo é como um rio, nunca poderemos tocar na mesma água duas vezes. Todos eram adultos e inteligentes, e era difícil de acreditar nessa hipótese. Era muito mais fácil de imaginar que eles não podiam aceitar que uma menina dessas daria um banho de musicalidade em tantos “medalhões” que ali estavam concorrendo.
Em 1996, não me fiz de rogado e me inscrevi de novo no festival, pois adoro participar e é um direito que sempre soube que eu tinha. Até achei que não iriam me classificar pelo estardalhaço do ano anterior mas, estava enganado e classificaram a música “Lendas Tropicais” que eu mesmo iria defender. Mesmo assim, fiquei ainda esperando alguma retaliação da emissora.
A coordenação, a mesma do ano anterior, marcou a eliminatória para um dia de domingo às 13:00, nos arcos da Orla de Atalaia com o palco voltado para o sol, um inferno para quem estava se apresentando e um grande desconforto para o público. Na pequena plateia que se formou, um grupo comandado por uma excelente cantora e compositora que participou do ano anterior do festival e que sempre fui fã. Até uma canção fizemos, o Alex e eu para ela. Todos esperavam ansiosos a minha participação e adivinhe para que? Para me vaiar! Me sentir importante e cantei melhor ainda, pois o sol que me aquecia estava torrando os miolos deles.
O festival teve como vencedores a música “Violar” do meu parceiro e amigo Rubens Lisboa, e da surpreendente Patrícia Polayne com “Camará”, uma outra jovem que tinha um grande futuro. Patrícia arrebentou e venceu na finalem Salvador o Canta Nordeste geral em 1996, a última vitória de Sergipe.
O Canta Nordeste lançou discos pelo Som Livre e colocou no mercado nordestino dezenas de nomes da música, quem soube aproveitar o trabalho realizado se deu bem, quem não, continuou na batalha, pois festival não é nem fim nem começo, e sim um caminho, uma vitrine para se mostrar e uma lente para observar e conhecer coisas novas. Sergipe sempre foi um protagonista desse festival!
Escolhi ser artista e não foi a arte que me escolheu. Estudei, trabalhei, gravei, cantei, interpretei e compus mais de 700 canções. Tenho parceiros de alto nível, como Alexi Pinheiro, Jorge Lins, Rubens Lisboa, Genival Nunes, Denys Leão, Emanuel Dantas, Nery, Mingo Santana, Kleber Melo, Antônio Amaral, Amorosa, Markus Trolleis, Carlos Braga, Djalma Oliveira, Jorge Reis, Rubens Paiva, Wagner Ribeiro, Marcelo Ribeiro, Jozailton Lima, Carlos Caué e Valter Nogueira.
Sempre escolhi viver com a verdade, aprendi com minha mãe é bisavó que eu tenho que fazer o que acredito! Se eu acredito, eu consigo fazer. Vivo para minha família e por elas trabalho muito. Não tenho tempo de guardar nenhum mágoa.
Tenho sempre um ditado da minha bisavó que anda comigo, “Nossa família veio para o mundo para fazer raiva e não para tê-las”. Não perco meu tempo para prejudicar ninguém e se for artista, terá a minha ajuda sempre. Vivo assim e vivo bem. Mais coisas precisam ser ditas para não serem repetidas.
*Neu Fontes*
Cantor, Compositor, Produtor, Publicitário e Gestor Cultural e
Presidente do Instituto Hélvio Dória