Sem querer me repetir, mas me vendo obrigada a isso, eu lhe pergunto: isso é hora de chegar, Estephânio?!

Creusa, eu acho que a gente não tem condições de conversar, agora.

A gente??? Eu tenho! Você é que não tem! Nem sei como acertou o caminho de casa! E sai daqui que eu não gosto desse cheiro de cerveja, você sabe!

Creusa, querida, eu sempre volto pra você, não importa onde eu esteja.

Claro, você não dorme sem mim…tem medo de escuro, tem medo de alma! Devia ter medo é da sua consciência! Alma não existe. A pessoa morreu, acabou!

Você que pensa, Creusa. O medo é uma defesa do ser humano, você nunca ouviu falar? E se eu tenho medo é porque alma existe. Eu nem preciso ver para crer. E vamos parar de filosofar, que eu preciso dormir!

E onde você estava até agora…? Com quem?

Já que você insiste e eu preciso dormir…eu estava num bar chamado Chique de Doer e nem preciso dizer: um bar da melhor qualidade, com gente da melhor qualidade.

Imagino! Pra você chegar a essa hora, 2 e meia da manhã…!

Você não estava lá porque não quer, porque não gosta. Mas eu teria o maior prazer de lhe levar lá. A cerveja é geladíssima, a qualquer hora que a gente chegue! E a comida, nem se fala! Eles fazem uma arraia…só de pensar, eu salivo. E o caldinho de camarão?! Da melhor qualidade!

Sei…

Não faça essa cara não, minha filha…você, que gosta de música, ia endoidar, lá… só toca música boa! Sabe aquele povo que tá em primeiro lugar nas rádios, que toca adoidado por aí e todo mundo sabe as músicas de cor? Não toca lá, de jeito nenhum! No Chique de Doer, é só a verdadeira música popular brasileira!

Você ainda não disse com quem estava!

Com os amigos de sempre, você sabe! E mesmo que eu fosse lá, sozinho, estaria bem acompanhado. Tonhão não deixa a gente se sentir abandonado.

Esse Tonhão é novo… me passe a ficha dele!

Tonhão é o dono do Chique de Doer, criatura! Não vá criando nada nessa cabecinha que Deus lhe deu! Pense numa pessoa boa, generosa, afetuosa, que é Tonhão… torcedor do Sergipe… apaixonado pelo bar. Também pudera…

Como assim? O que tem esse bar?

Creusa, eu vou levar você lá, de qualquer jeito! E você vai querer voltar mil vezes! Eu vou até me arrepender. É um bar de esquina, bem simples, mas fica em frente a uma pracinha, é super ventilado, a gente não sente calor de jeito nenhum. Em volta, tudo arborizado. Fica no Luzia. De vez em quando, Tonhão promove uma roda de samba – da melhor qualidade! Sinceridade? Só volto pra casa porque tenho você!

Sai pra lá com esse cheiro de cerveja, Estephânio! Amanhã, quem sabe… a gente pode ir lá. Me dá o endereço pra eu olhar no Google. Vou pensar.

Não pense muito, não, minha filha…ele abre de quarta a domingo. Abre às 9 da manhã e fecha quando o último cliente sai.

E o último é sempre você, né?! Me passe o endereço, vai..!

Rua Simões Cruz, 19. Você vai pela Nestor Sampaio e entra numa praça depois que passa pelo Colégio Purificação e vira à esquerda. Tá satisfeita? Agora, basta. Quero dormir!

Só deita aqui se tomar um banho. Se não quiser, vai dormir na sala – com as almas!