Minha década favorita é a de 80, grandes mudanças aconteceram, caiu o AI 5, tivemos eleições diretas, me lancei como artista solo, gravei meus 06 discos, cantei para duas pessoas e para mais de 100 mil. Minhas músicas estavam na boca do povo. Fiz mais de 90 shows ano, e ganhei minhas filhas, Erica e Tatiana uma década de alegrias e vitórias.
Uma década de muito efervescência musical em Sergipe, década do Festival Sergipano de Música Popular Brasileira (FSMPB), tendo como ganhadores “Mercado Thales Ferraz” com Alcides Melo em 1981 e “Popular Americana” com o Grupo Repente em 1982. Shows bem produzidos aconteciam no Teatro Atheneu. Um deles, em 81 deu origem ao grupo Entre Amigos formado por: Neu Fontes, Alexi Pinheiro, Emanuel Dantas, Dalila Aragão, Mauricio Botto, Jairo Bala, Cal Alencar, Marcus Passos, Paulo Bedeu, Denys Leão e Genival Nunes. O grupo rompeu paradigmas de produção, com planejamento, direção e comunicação, além de iluminação, boas músicas e arranjos impecáveis. Alguns shows que vieram logo após tiveram a mesma preocupação e cuidados, como “Anjo Claro” de Clara Angélica, “Cantarina” de Joésia Ramos, “Florescer” de Lula Ribeiro, Irmão e Tonho Baixinho, Alexandre o Português musical, entre tantos outros.
Mais em 1983, três das boas cabeças da então recém-nascida FUNDESC – Fundação Estadual de Cultura, vinda de uma luta capitaneada pelo Luiz Eduardo Costa, tem em seus quadros muita gente bacana e criativa, entre eles estavam o Jorge Lins, José Américo (Sucupira) e Antônio Amaral, com o apoio da Acácia Barreto, que pensaram, criaram e executaram o Festival Novo Canto, voltado para estudantes secundaristas de Sergipe. Um grande sucesso o Festival, que lançou muita gente boa como Chico Queiroga, Antônio Passos, Marcos Aurelio, Kleber Melo, Antonio Rogerio, Cris Emmel, Sergio Luiz, Cledivan Lobo, Fabio Dorea, Rubens Lisboa, Jarbas Moreno, Jadilson Moreno, Goergo Martins, Malba, Gena Ribeiro, Alex Santana, Marcio de Dona Litinha, Doca Furtado entre tantos outros grandes artistas.
Um dos destaques lançados pelo Novo Canto foi o simão-diense, José Lucivaldo Carvalho Silveira, ou Nininho Silveira, como ele se apresentou no Novo Canto de 1987, no qual conquistou o 1º lugar, e 1988 em 3º lugar.
Hoje, este multifacetado artista é mais conhecido como Nino Karvan. Formado em comunicação, Nino é luthier, terapeuta especializado em musicoterapia, cantor, compositor, produtor musical, agente cultural, ator e apresentador de programas de TV e rádio. Foi descoberto cantando “Galopeira”, uma música do paraguaio Mauricio Cardoso Ocampo, e um dos primeiros sucessos de Chitãozinho e Xororó. Em uma roda de seresta, quando menino, foi crooner da “Tribos” uma banda de baile da sua cidade natal, aprendendo na escola dos bailes a cantar e conhecer de tudo na música.
Um inquieto das artes que conheci no Festival “Novo Canto” onde fui jurado, ele levou o primeiro lugar. Nininho tinha estilo na sua composição e era afinadíssimo. Cantava uma música com sotaque regional, mas com pitadas universal, preocupado com o meio ambiente e o social.
Avistei o Nininho, agora como Nino, cantando nos bares da vida, sempre ao lado do violão e do seu parceiro o Aroldo no Sax.
Nos anos 2000 abri um estúdio de gravação profissional, o “Capitania do Som” e lá tive a oportunidade de conhecer melhor o Nino Karvan, pois ele gravou músicas pelo Sescanção, festival que ele ganhou duas vezes e também pela gravação do seu primeiro CD, Mangaba Madura. Tivemos algumas conversas antes da gravação, pois o Nino tinha duas ideias: gravar uma voltada para o samba e outra para a músicas bem nordestinas. Acho que as minhas sugestões fizeram com que o Nino escolhesse o Nordeste como tema do seu Mangaba Madura. Mais tarde, ele produziu o CD da cantora Raquel Delmondes e faz a mixagem e a masterização também no Capitania.
O samba não sai da cabeça do Nino e ele lançou em 2006 o seu segundo trabalho, o “Aquarela para Pandeiro”, álbum que o levou até a china. Era o menino de Simão Dias ganhando asas e mostrando seus bordados musicais além-fronteiras.
Lançado em 2013, “José” foi seu terceiro trabalho, e “No romper da madrugada”, de 2015, foi seu quarto álbum, o que mais gosto. O disco conta com onze músicas autorais e letras que falam de amor, diversidade, ecumenismo e boemia.
“Eu sou madeira,
Eu sou madeira de lei que Deus mandou
Pra Fazer samba bonito a noite inteira” …
Da primeira faixa “Madeira de Lei”, música que abre o disco com muita elegância e cadência.
A música título é seu convite a boemia;
“Quando a lua lá no céu anunciar a batucada,
samba de cuíca no romper da madrugada.
Samba pra mi iô iô, Samba iá iá.
Eu quero ver você Chorar” …
Produzido pelo Nino e com arranjos do excelente músico e maestro Ricardo Vieira, ainda conta com a participação do Xangai na faixa Fulorô
… Aquele que planta o bem colhe amor e poesia,
Aquele que fere é quem ferido será um dia…
O álbum tem a participação de músicos de alto nível e ainda traz uma regravação do Noel Rosa “Último Desejo”. Um disco de muito responsa, vibrante e elegante.
O Nino é um artesão, como uma bordadeira que alinha cada detalhe, cada ponto, cada nó, misturando sons, procurando raízes e suas ligações com o universo, samba, Bossa, Xote, Xaxado, Baião, Coco, embolado, rap e Rock criando música.
Drummond diria que alguns – como Nino – são trigo de qualidade especial, pois servem de alimento constante. A gente fica sentido e relembrando sempre o gosto dessa comida. A citação foi referida a Cartola, mas se aplica sempre a outras boas sementes.
Eu sou o samba, sou natural de Simão Dias, sou o Nino, cidadão do samba universal.
Neu Fontes
Cantor, Compositor, Publicitário, Gestor Publico
Presidente do Instituto Hélvio Dorea Maciel Silva – IHDMS